Não haveria “mateiros” se não houvesse compradores de orquídeas “do mato”.
As exposições de orquídeas, que tanto atraem as pessoas para o cultivo dessas flores, se traduzem, sempre, numa grande celebração à natureza. Ao deixar-se encantar pelas orquídeas, o visitante vai interessar-se por diferentes aspectos da orquidofilia e, necessariamente, vai querer, no futuro, proteger as orquidáceas, não apenas em sua estufa e nas árvores do jardim, mas também na natureza.
Contraditoriamente, muitos orquidófilos esquecem as preocupações ambientais e se dobram a uma prática lamentável: a compra de orquídeas surrupiadas de seu habitat natural pelos chamados “mateiros”. Demonstrações dessa prática perversa, por incrível que pareça, acontecem à porta de algumas grandes exposições nacionais, às vistas das autoridades às quais compete coibir o crime ali praticado.
Sim, porque comercializar orquídeas retiradas “do mato” é crime. A coleta na natureza, transporte e comercialização de orquídeas assim obtidas são atos criminosos. De acordo com a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, em seu Art. 48, “receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal (…)” é crime passível de detenção, de seis meses a um ano, e multa.
No parágrafo único do mesmo artigo, observa-se que “incorre nas mesmas penas quem vende, expõe a venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem licença válida (…)”. Embora não se refira especificamente às orquidáceas, a legislação abrange essa família.
E surge um agravante no Art. 53, onde se prevê que a pena será aumentada de um sexto a um terço, caso se trate de espécie rara ou ameaçada de extinção. Isto significa que quem vende ou compra, por exemplo, uma Cattleya labiata, espécie em extinção, retirada diretamente de nossas matas, está cometendo um crime ambiental sobre o qual pesam agravantes.
Se, por um lado, é flagrante a incapacidade – ou desinteresse, ou incompetência, ou tudo isso junto – por parte das autoridades ditas “competentes”, ao mesmo tempo registra-se a insensibilidade de muitos colecionadores que, mesmo sabendo da ilegalidade, insistem em comprar aquelas plantas maltratadas e cobertas de líquens, que se expõem nas calçadas, bem ao lado das exposições. Admita-se: não haveria “mateiros” se não houvesse compradores de orquídeas “do mato”.
A Associação Cearense de Orquidófilos tem, a propósito, uma atuação exemplar. Desde que foi reativada, em 2007, a ACEO vem trabalhando a consciência ambiental e divulgando, junto aos associados, a ideia de ajudarem no combate ao comércio ilegal de orquídeas. Para desestimular a compra de orquídeas subtraídas das serras cearenses, organizam-se aquisições coletivas em orquidários comerciais, que comercializam apenas plantas reproduzidas (legalmente) em laboratório.
Ao mesmo tempo, expõe-se um argumento de peso: as orquídeas surrupiadas da mata são, em geral, portadoras de fungos, bactérias e outras pragas e doenças que podem contaminar todo o orquidário, obrigando ao uso de dispendiosos defensivos químicos – tão prejudiciais ao bolso quanto à saúde humana e ao meio ambiente. Além do mais, a qualidade dessas flores é sofrível, em contraste com as do comércio legal, que, além de sadias, apresentam ótima estética, como resultado de longo e cuidadoso trabalho de melhoramento genético.
Um sinal evidente de que os esforços da ACEO foram recompensados é o fato de que, nas suas exposições, não se reproduz, jamais, o triste espetáculo do comércio de orquídeas subtraídas da natureza. Apenas os orquidários comerciais estão autorizados a atuar no evento, enquanto se exerce severa vigilância nas proximidades para evitar a atuação de “mateiros” que, na verdade, já descobriram, há muito tempo, que ali não há lugar para eles.