A esposa Katia e as filhas Carol e Vitória são, no coração do Dr. Benedito Ângelo Lo Ré, as únicas paixões mais fortes do que as orquídeas. Ginecologista, obstetra e também auditor, ele reside em Serra Negra, interior de São Paulo, e é um dos mais respeitados nomes da orquidofilia brasileira, assumindo, sem disfaces, a condição de “labiateiro” inveterado. Aqui, transcrevemos sua entrevista ao “Boletim ACEO”.
Associação Cearense de Orquidófilos: O amor dispensa explicações. Mesmo assim, tente explicar sua paixão pela Cattleya labiata.
Ângelo Lo Ré: Como foi dito na pergunta, sem explicações. Mas vou tentar. No começo é aquela febre, a gente coleciona até capim com cara de orquídea. Meu começo, na verdade, não teve uma data marcante. Meu pai sempre cultivou orquídeas. Hoje, com 84 anos, cuida de todas as suas plantas diariamente. Foi assim que eu cresci, vendo orquídeas, cuidando de orquídeas. Com o decorrer dos anos, casei-me e construí meu próprio orquidário. Acredito que, há cinco anos, comecei a enxergar algo mágico nas labiatas. Talvez eu sempre as visse, mas não as enxergava. Foi admirando os desenhos do labelo e, principalmente, notando as diferenças, que a paixão começou. Paixão, diga-se de passagem, com cara e toda pinta de alucinação. Comprei lotes. Coleções mesmo, daquelas de fazer lista, e indo atrás de cada uma. Como gosto de estudar, não comprei só labiatas, mas também livros. Vários deles. Aí a paixão aumentou. Juntos, a coleção e o estudo fizeram de mim um labiateiro. Anos a fio lendo, cuidando, estudando e conversando muito com os criadores.
ACEO: E o que você descobriu na Cattleya labiata?
Ângelo: O que a labiata me ensinou foi muito mais sobre ela mesma, foi sobre a orquidofilia e a orquidologia. Através da labiata fiz amigos. Posso dizer que, por causa da labiata, praticamente entrei no mundo da orquidofilia de verdade.
ACEO: A labiata já o levou a conhecer lugares e pessoas?
Ângelo: Estando uma vez em Fortaleza, não pude deixar de ir à casa de Vera Coelho, onde pude ver, finalmente, a Cattleya labiata Lindley, a mesma que eu tanto estudava, em seu próprio habitat. Esse é só um exemplo. Sempre digo a todos os meus amigos que estão iniciando ou já iniciados na orquidofilia: não olhem para as labiatas. Não comprem labiatas. Vocês não sabem o perigo em que estão se metendo. Aliás, nunca vi uma verdade tão grande como a da lenda da orquídea: a labiata é como a jovem Hoan-Lan, que se divertia em fazer penar seus admiradores. Quem quiser enveredar pelo caminho da labiata, que se sinta avisado: você não descansará até ter a última variedade da estamparia do labelo, ou a cor mais diferente das pétalas e sépalas.
ACEO: O que cultiva, em seu orquidário, além da Cattleya labiata?
Ângelo: No meu orquidário, tenho espaço para Laelias purpuratas, Cattleyas intermedias, algumas Encyclias e alguns híbridos. Mas, de uns dois anos para cá, venho dedicando-me (e que me perdoem as labiatas) à tribo das Vandáceas. As Vandáceas são plantas exclusivamente monopodiais, que possuem três subtribos: a Angraecinae, a Aerangidinae e a Aeridinae. Essa tribo ocorre desde o Leste da África até a Ásia, passando por Butão, Mianmar, Índia, Tailândia, Malásia, China, Japão e Oceania. O mais interessante está justamente na dificuldade de fazê-la florir. É sempre assim: se envolve estudo e dificuldade, o orquidófilo gosta mais. As plantas da tribo Vandaceae mais encontradas no Brasil são: Aeranthes, Aerides, Angraecum, Arachnis, Ascocentrum, Euanthe, Papilionanthe, Renanthera, Rynchostylis e, principalmente, a Vanda. Não poderíamos deixar de fora o híbrido mais popular: a Ascocenda (Ascocentrum x Vanda).
ACEO: Como você cultiva suas labiatas? Utiliza alguma prática especial?
Ângelo: Vamos começar do começo. Seedlings de labiata devem ser primeiramente cultivados em cachepot de madeira. Até hoje, não entendi exatamente o motivo, mas eles crescem muito rápido se colocados em cachepot. Já mais crescidinhas, então costumo colocar as labiatas em cachepot maior ou em vaso de barro. Elas gostam de temperatura mais alta, tanto é que não ocorrem no Sul do País, e sim no Nordeste. Apreciam muito o vento e a umidade. No meu orquidário, cultivo sob tela de 70%, sem telha ou plástico agrícola. Deixo que tomem chuva e sereno. Rego todos os dias, embora sem muito exagero, mas, na verdade, as labiatas, quando estão emitindo novos brotos, precisam de muita água.
ACEO: E quanto à adubação, substratos, regas… da C. labiata?
Ângelo: Com relação à umidade, em meu orquidário cultivo as labiatas em varais, ou seja, suspensas. Sob as plantas, mantenho pequenas e rasas piscinas, feitas de azulejo. Dentro se tem areia, argila expandida e plantas aquáticas. Isso garante farta umidade sob as plantas. Quanto à adubação, acredito que as labiatas necessitam e agradecem. Utilizo quase que semanalmente uma mistura de Biofert Plus* (5 ml por litro) e Complexo B (3 gotas por litro). Já nos vasos, faço meu próprio Bokashi, em forma de pelets, que vão desmanchando muito devagar. Cada bolota de Bokashi dura até dois meses para sumir. Quanto a substrato, não tem jeito, o melhor mesmo é o xaxim. Pena que não exista ainda um plantio sustentável da Dicksonia sellowiana. Como medida mais do que justa, o Estado de São Paulo proibiu a comercialização do xaxim. Então, não tendo outra opção, estou usando o coco, em forma de cubinhos, com pequenos pedaços de carvão. O coco não compacta a planta no vaso e ela acaba ficando solta. Por isso, misturo um pouco de esfagno, que dá alguma sustentação. Não dispenso o uso de casca de Pinnus na mistura. As labiatas sofrem muito com cochonilhas, pelo menos na minha região, que é muito fria. Por isso, mensalmente uso defensivo agrícola. Como sou totalmente contra o uso de organo-fosforados ou clorados, gosto muito dos piretróides. Tenho usado um produto chamado Karate* (Lambdacyhalothrin), cerca de 1 ml por litro.
ACEO: Fale dos esforços para se criar uma classificação cromática da flor e configuracional do labelo da C. labiata, em âmbito nacional.
Ângelo: Não é nada fácil tentar montar e organizar uma classificação nacional. Existem vários fatores que atrapalham. Por exemplo, a distância (que é superada pela Internet) mas, principalmente, o mais difícil está em convencer alguns “orquidófilos” de que a classificação deve ser democrática. Tem orquidófilo que quer o júbilo de fazê-la sozinho, como se estivesse com isso ganhando fama, dinheiro ou sei lá… Sinceramente, não entendo por que pessoas querem fazer uma classificação sem que outras ajudem e até mesmo se negam a participar de um grupo que democraticamente quer trabalhar junto. Um fator também importante é que existem muitas diferenças entre as denominações nos vários Estados, principalmente no Sul do País. Mas, enfim, estamos caminhando e, se tudo der certo, em breve vamos ter uma classificação nacional. Embora existam orquidófilos tremendamente narcisistas, encontrei nesse árduo caminho pessoas despojadas de egocentrismo, gentis e prontas a ajudar. São orquidófilos que, acima de tudo, amam a C. labiata e o seu estudo e não estão preocupados em ter seu nome à frente da classificação.
ACEO: O que há de errado e quais são os méritos da orquidofilia brasileira?
Ângelo: O grande mérito, sem dúvida, é ter os grandes fóruns de debates. As listas, que no começo eram só uma maneira de bater papo, hoje são uma grande fonte de cultura, conhecimento e amizades. Não tenho dúvidas de que a orquidofilia brasileira é hoje uma grande família. Aliás, diga-se de passagem que o Brasil possui os maiores fóruns de debates do mundo. Já pelo lado da orquidologia, acho que temos falta de livros. Escreve-se muito pouco. A maioria das informações chega de boca em boca e essa é a forma mais fácil de propagar uma inverdade. Notam-se nas bancas muitas revistas de fotos, às vezes com nomes errados. Vendo essas revistas, puramente de fotos de orquídeas, tenho a sensação que transmitem ao orquidófilo muito mais a paixão por outra arte, que é a fotografia. Precisamos de livros, precisamos que mais e mais orquidófilos escrevam, principalmente sobre as nossas plantas. Tomemos por exemplo a Cattleya labiata. Quantos livros existem para essa planta? Dois ou três e nada mais. Outra crítica que se vê facilmente é a produção de híbridos nacionais, entenda-se aqui, feitos com matrizes de plantas puramente nacionais. Não há uma tradição muito forte na criação de híbridos, excetuando-se, é claro, pouquíssimos serviços, como, por exemplo, a Nobile Flores. Por outro lado, existem vários produtores fazendo híbridos com Phalaenopsis. Mas isso os tailandeses já fazem há anos. Outro assunto relativo à orquidofilia são as exposições, pois estão diretamente relacionadas às atividades da orquidofilia, incentivando encontros, troca de informações, muita amizade e negócios. Quanto a exposições, notamos que o poder público pouco ajuda. Não há, no Brasil, de forma alguma, incentivo do poder público para as exposições, que propagam o bom nome da cidade e da região, trazem turistas e divisas. Acredito que as prefeituras deveriam incentivar as exposições.
fazendo pesquisa para cuidar de umas orquideas que tenho , descobri seu site.Minha mãe sempre ganhou orquídeas,como ela já está de idade eu aprendo a cuidar das meninas.parabéns pelo trabalho de vcs..
clery
Boa tarde,
às vezes viajo a serra negra a pesseio. Seria possível em uma destas viagens conhecer Angelo e seu orquidário. Grata
Foi imensamente proveitoso conhecer, ganhei de presente uma Catlleya Labiata, e tenho cuidado dela, moro em Recife, o clima hoje tem mudado, e recentemente tem aparecido uma pintas pretas na sfolhas, o que devo fazer?
Me ajudem!!!
Adorei a matéria. Eu quero uma Catlleya labiata Pérola?
Como encontrar?